Logística reversa evolui, mas ainda encontra desafios no Brasil

Entre as dificuldades, está a burocracia no transporte e a ausência de uma política fiscal

Entre todas as obrigações ambientais do setor empresarial brasileiro, uma se destaca como a responsável por garantir que produtos descartados pelos usuários sejam reciclados. Este processo é chamado de ‘logística reversa’, não sendo apenas um dever do fabricante, mas também de importadores, distribuidores e comerciantes desses produtos.

Hoje, no Brasil, alguns tipos de produtos possuem uma cadeia de logística reversa já bastante desenvolvida, ou em vias de, por já possuírem acordo setorial ou regulamento com regras claras para a prática. É o caso das embalagens de agrotóxicos, óleos lubrificantes e lâmpadas. Outros, no entanto, ainda estão em fase de discussão, como os medicamentos de uso humano e os eletroeletrônicos de uso doméstico. O retorno dos produtos é viabilizado, entre outras maneiras, pela compra dos materiais recicláveis, instalação de pontos de entrega (PEVs)  e também por parceria com cooperativas de catadores.

De acordo com o advogado Fabrício Soler, sócio da Felsberg Advogados, um dos principais desafios para o funcionamento e a ampliação da logística reversa no Brasil é a ausência de um tratamento fiscal diferenciado para os resíduos. “Já são  tributados a matéria-prima e o produto e, acredite, o Estado ainda tributa o resíduo que retorna, quando na verdade deveria isentá-lo para fomentar o desenvolvimento da cadeia de reciclagem”, diz.

Outra questão importante é a dificuldade em relação ao transporte dos materiais. Como o Brasil é um país de grandes dimensões territoriais, é custoso fazer com que estes materiais retornem até o polo reciclador, quase sempre na Região Sudeste, que concentra a maior parte dessas indústrias. “Neste sentido, também temos a dificuldade com a pulverização de legislação que tenta regulamentar a prática, muitas vezes sem observar as diretrizes nucleares da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS)”. Em nove anos da PNRS, houve mais de 500 atos normativos sobre resíduos nas três esferas de poder, federal, estadual e municipal. A multa para quem não respeita as regras previstas pode variar entre R$ 5 mil e R$ 50 milhões.

Estes são alguns dos entraves, visto que a logística reversa em si pressupõe uma viabilidade técnico-econômica para implementação gradual. Para Soler, o melhor exemplo de sucesso neste quesito é o sistema de lâmpadas, onde os importadores são obrigados a recolher o valor aproximado de R$ 0,41 por unidade. Isso tende a garantir a sustentabilidade econômica porque o preço final, repassado ao consumidor,  incluirá o valor dos custos, ainda que parcialmente, da logística reversa.

Na visão do especialista, porém, é um erro encarar o processo como uma obrigação meramente empresarial, sendo que o gerador do resíduo em si é o consumidor que utiliza os produtos fabricados, importados, distribuídos e comercializados em território nacional. “É indispensável o papel do usuário na devolução dos produtos. O consumidor tem que fazer parte do processo. Não adianta ter estrutura se o ele não adere. O cidadão é fundamental dentro da viabilização da logística reversa”.

Segundo a análise feita pelo Sindicato Nacional das Empresas de Limpeza Urbana (SELURB), em parceria com a consultoria PwC, a PNRS é clara ao estabelecer a responsabilidade compartilhada pela logística reversa dos resíduos sólidos entre governos, iniciativa privada e consumidores. O engajamento com a questão é um dos fatores que compõem o cálculo do Índice de Sustentabilidade da Limpeza Urbana (ISLU), que mede a aderência dos municípios à PNRS.

Serviço em expansão

Em um dos maiores aterros sanitários da América Latina, localizado em Caieiras, há uma área destinada à logística reversa. Empresas de diferentes segmentos firmam contrato para a prestação de serviços como recuperação fiscal, destruição de cargas danificadas e descaracterização de materiais eletroeletrônicos para posterior venda dos recicláveis e correta destinação.

Segundo o analista técnico operacional da UVS Essencis Caieiras, Wilson Scapin, o processo de logística começa pelo recebimento da carga, e passa pelas etapas de: triagem, desmontagem, armazenamento dos materiais e encaminhamento para os recicladores.

“Os materiais obtidos pela logística reversa não retornam para o seu originador em si, é importante ressaltar, mas sim para a cadeia de produção”, informa. Para ele, um dos principais desafios hoje é a conscientização sobre a importância deste processo. Existe um ganho de marca expressivo, uma vez que se trata de um serviço voltado ao meio ambiente. Além disso, é um serviço em expansão. Além de São Paulo, por exemplo, nós estamos ampliando a operação em logística reversa para outros estados”.

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