Lixo gerado por pessoa é em média 8% menor em municípios onde há cobrança específica

Reportagem Estadão Broadcast

Por Amanda Pupo


Brasília, 06/08/2021 – Exigência do novo marco legal do Saneamento, a cobrança pelos serviços de manejo, tratamento e descarte do lixo tem potencial de não somente dar sustentabilidade financeira à atividade, mas como repercutir positivamente na geração de resíduos gerados pela população. É o que aponta uma pesquisa inédita realizada pelo Sindicato Nacional das Empresas de Limpeza Urbana (Selurb). A entidade calculou uma redução em média de 8% do total de lixo gerado per capita em cidades onde há algum tipo de arrecadação específica para bancar esses serviços. Antecipado ao Broadcast Político com exclusividade, o estudo aponta que a diminuição equivale a um mês sem geração de lixo no País, ou seja, um ano de economia a cada 12 anos.

O Selurb analisou dados de 3.712 municípios, em todas as regiões do Brasil. Entre eles, apenas 1.662 contam com alguma cobrança individualizada para as atividades relacionadas ao lixo. A expectativa da entidade é que o cenário se transforme ao longo dos próximos anos, já que o marco legal exige que as prefeituras criem essa arrecadação específica. Na teoria, isso já deveria ter avançado até o dia 15 do mês passado, quando a lei completou um ano em vigor. Segundo o texto, a não proposição de instrumento de cobrança dentro desse prazo passa a configurar renúncia de receita, exigindo que as gestões demonstrem que têm meios de sustentar os serviços. Se não conseguirem comprovar, podem até responder legalmente.

O cenário brasileiro, por sua vez, aponta que as cidades têm dificuldade em bancar essa atividade apropriadamente. Estima-se serem necessários cerca de R$ 7,5 bilhões por ano de recursos fiscais para cobrir o déficit das despesas operacionais com resíduos sólidos urbanos, segundo dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (Snis), plataforma do governo federal. O número envolve até mesmo municípios que já instituíram alguma forma de cobrança, uma vez que, entre eles, pesquisas apontam que menos de 1/8 arrecadam o suficiente para cobrir totalmente os custos dos serviços relativos ao lixo.

Presidente do Selurb, Márcio Matheus afirmou que está otimista com o movimento de criação de tarifas e taxas pelo Brasil, apesar de uma enquete preliminar e parcial da Confederação Nacional de Municípios (CNM) ter indicado que grande parte das cidades não deve ter proposto uma cobrança até o dia 15 de julho. “A data foi um referencial. O mais importante é implementar a cobrança a qualquer tempo”, disse Matheus. Ele destacou que no ano que vem as contas dos municípios vão ser analisadas pelos órgãos de controle, que precisarão avaliar se a prefeitura cumpriu a lei. “Se ele não conseguiu fazer a proposição a tempo, fazendo até o fim do ano, o tribunal vai ver que ele se mexeu, não ficou inerte. Diferente de o município não fazer nada”, afirmou o presidente do Selurb.

Os números de redução de geração de lixo onde há cobrança também animaram a entidade. Os setores que defendem uma arrecadação já vinham argumentando que a medida também geraria um efeito comportamental nas pessoas, que, ao desembolsarem um valor específico para pagar os serviços, acabam tendo mais consciência sobre o custo dessa produção. É o que já acontece hoje com a tarifa pelo consumo da água. A pesquisa do Selurb acaba por atestar essa experiência do usuário, entende o sindicato.

“A pesquisa mostrou um fator interessante para nós, da economia comportamental. A cobrança muda a relação das pessoas com os resíduos, da mesma forma que a cobrança pela água muda a relação com o consumo”, disse Matheus. Ele lembrou que esses resultados se alinham com o que aconteceu na cidade de São Paulo entre 2003 e 2005, quando vigorou uma taxa do lixo na capital. No período, a geração de resíduos diminuiu cerca de 10% em relação aos anos anteriores, e voltou a aumentar após a interrupção da cobrança.

Além de uma produção menor de lixo, a cobrança se reflete numa melhora na prestação dos serviços de resíduos. É o que aponta o Índice de Sustentabilidade de Limpeza Urbana de 2020, produzido pelo Selurb e PwC Brasil. Todas as dez cidades mais bem pontuadas no índice (com mais de 250 mil habitantes) cobrem pelo menos 94% das despesas por meio de arrecadação específica. As quatro primeiras colocadas – Santos, Niterói, Blumenau e Rio de Janeiro – pagam quase ou integralmente 100% desses custos a partir de uma taxa ou tarifa.

“Onde não tem cobrança você tem uma relação inversa. Praticamente, a sustentabilidade do serviço é ruim, ele não consegue atender a coleta totalmente, a destinação totalmente, acaba recorrendo a destinação irregular. Se vale de lixões, aterros controlados”, afirmou o presidente do Selurb, que lembra que o problema não é apenas financeiro.

A produção de lixo no mundo é um problema ambiental considerado grave. A estimativa é de que o custo para remediar a poluição gerada por lixões possa chegar a ser 34 vezes mais caro que a destinação adequada dos resíduos sólidos. Em uma década, o País viu a produção de resíduos sólidos urbanos crescer 11%, passando de 71,2 milhões de toneladas por ano em 2010 para 79 milhões de toneladas agora, segundo a Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe).

“Nós temos uma perspectiva de que em algum tempo, assim que aumentar a cobrança, e ter uma cobrança efetiva que recupere integralmente os custos dos serviços, entendemos que vamos ter um índice maior de diminuição da geração, que é o melhor dos mundos para todos nós”, disse o presidente da Selurb.

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